Esperava
a mulher sair do mercadinho, carro estacionado na rua calçada onde o mato
crescia entre os paralelepípedos e encostado ao meio-fio. Passou a prestar
atenção em um cão que cheirava cuidadosamente as moitas de capim, urinando em
seguida sobre a que teria selecionado pelo olfato. Depois da urinada ele se
voltava de costas para a moita e movimentava as pernas traseiras como se as
quisesse encobrir com terra. Repetiu esse procedimento várias vezes e depois
entrou por um vão entre as tábuas do portão da propriedade que certamente o
abrigava.
Passou a pensar
nas muitas cercas construídas pelo mundo afora e mal notou a mulher abrir a
porta do carro e entrar com o pacote da pequena compra que fizera.
— Vamos ficar
parados aqui? — perguntou-lhe.
Ele pôs o carro em
movimento, olhar ausente denotando o
seu costumeiro envolvimento com pensamentos graves. Narrou a cena do cão para a
mulher, que respondeu:
— Todo cachorro faz o mesmo.
— O cão é irracional,
mas no instinto ele tem o mesmo defeito do homem, pois é mais violento contra
os da mesma espécie, quando se trata de proteger os seus domínios.
— Tu queres me
explicar o ponto?
— No instinto, gente também faz o mesmo —
respondeu ele para a mulher, que se preparou para ouvir uma longa exposição —.
O homem toma para si tudo o que pode, esteja dentro ou fora dos seus domínios,
mas no que lhe pertence por direito, ai daquele que intente nele executar os
seus planos de conquistas.
— E o cão que sai na rua também não vai
desfazer as marcas alheias na frente de outros quintais?
— É como te disse: Ele tem o mesmo defeito
que existe no homem: Mas, chegando à frente do seu quintal um outro cão
demarcando a moita que ele entende pertencer-lhe com exclusividade, que o
estranho se prepare para uma luta encarniçada, se a diferença de tamanho e
ferocidade não for muito grande! E como acontece com os cães, também entre os
humanos. A vitória é sempre do mais forte ou poderoso. Este vai demarcando os
territórios de quantos sejam mais fracos, ou menos poderosos do que ele.
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