quinta-feira, 10 de maio de 2012

Três poemas da coleção: "O Vento Girou"

11 de setembro de 2001

Quase sem préstimo o canhão,
Que sucedeu a espada,
Aremessada caótica
Dilacerando os corpos.
Voa bem alto o avião,
Ogiva bem armada
Com bomba atômica exótica:
De estrangeiros os mortos?

Também esta arma é inútil
Quando se imola o homem
Ao deus vingativo e às pestes.
Talvez um dia se calem
Canhões, aviões, ânsia fútil
Daqueles que vivem ou dormem.
Manchadas de culpas as vestes,
Diante de Deus que ainda falem.



Costumes e conselhos desprezíveis

Se os costumes forem meus, não haverá quem os adote.
Se forem meus os conselhos, serão sempre maus juízos.
Precavidos contra a lavra do que antes não havia
Há que indagar da autoria: Quem o fez? Ou: Quem o disse?
E me induzem ao desvario de comportamento antigo,
Como se fosse bom para sempre o rejeitar-me
E frustrarem-me a conquista que a muito não consigo.

Argüindo a minha lira, peço-lhe que sem engano responda
E lhe pergunto: condenas-me, ou me declaras inocente?
Ouço então que se repete o que dantes ecoou
Nas falas que ao apóstolo outrora deu resposta:
Que te baste o poder que modelo na fraqueza,
Pois facilmente se quebram fragilidades passageiras,
Mas permanece para sempre a eterna obra que eu faço.

 Ó firme fundamento, agravas a presente esperança,
Que, como dizes, é o fruto de instante passageiro!
É certo que estás posto como firme ancoradouro,
Que a minha débil fé só vislumbra no porvir.
Também tu és consolador agora e no depois,
Mas sinto no meu peito esperança que não vejo.
Concretiza-a aí, pois não quero mais sofrê-la aqui.



Entre o Inverno e a Primavera

Quando não há sol tão enviesado,
O pôr-do-sol se mostra cor de gris.
É o inverno que se vai embora
E emerge o bosque aflorado
Na estação, de primavera aprendiz,
Esplendor que muito não demora

É tempo se mostrando incerto,
Entretempo de frio e flores
Reclamando uso de agasalho
E às vezes dorso a descoberto
Que convida amantes aos amores
E velhos a tomar um chá com alho.

A vida também é uma incerteza.
Pode exaurir-se com um resfriado,
Consumir-se pela safadeza,
Fanar-se com um sopro agônico,
Ante um acidente caprichado,
Ou pela ação vencida de um tônico.