RETRATO DE UMA DEPRESSÃO
Carlos Mendes
Disse uma repórter: “Com a chegada das flores plásticas,
nunca faltam flores na praça”.
Fui conferir a existência do presumido belo da florada que
imita a ocupação primaveral dos galhos ressequidos nas árvores e nos arbustos
naturais e concluí: É beleza morta disfarçando o contratempo.
Adversidade igual e invisível
carrega no peito quem não tem mais jeito para a alegria brotando
espontaneamente do âmago da alma; e o que tenta imitá-la, só consegue colocar no rosto
um convulsionado sorriso, impromptu
de alegria ou pulsão de conveniência
que logo escapa à alma; alegria que só aceita o alegro saltitante e o vivace esfusiante
no modo das execuções musicais, que servem ao gosto das danças aos rodopios, com pares embriagados pela ventura efêmera, que se vão buscar nos salões das
animadas e passageiras festividades; triviais alegrias nos corpos e embaraços
nas almas depressivas, deduções nos acanhados expedientes de tais fulgores
outrora vividos nas experiências, as quais nos levam a enxaqueca muito parecida
com a do porre que sucede as grandes bebedeiras.
Sem comentários:
Enviar um comentário