sábado, 22 de dezembro de 2012

Artigo


Solidariedade responsável
                                          Carlos Mendes


Como se encadearão os poderes da mente e por que alguns são mais potentes? Se “a razão é a maneira de organizar a realidade pela qual esta se torna compreensível” (MARILENA CHAUI, Convite à Filosofia, 5ª Ed. p. 59), como compreender a realidade da existência crescente de indivíduos buscando a estupefação provocada pelo consumo do álcool e outros tóxicos? Qual o valor intuído das drogas por parte dos iniciantes? Terá alguém a possibilidade de formar sobre o uso das drogas, e seus efeitos, uma compreensão global e instantânea? Um sonoro NÃO! será a resposta lógica para esta última questão, o que me anima a formular uma teoria a respeito do ingresso dos indivíduos no mundo dos drogados: na grande maioria, eles são convencidos ou persuadidos a essa experiência estupefaciente, como se pudessem, pelo seu consumo, conseguir mágicos benefícios.
Vimos essa nossa teoria corroborada pelo pronunciamento do Sr. Odair Cano Honório(*), presidente do C.A.V., quando fomos entrevistados num programa de rádio. Na ocasião o Sr. Odair apresentou dados estatísticos de algumas pesquisas que indicam serem os amigos e colegas dos dependentes os principais agentes de promoção desse maléfico hábito de consumo. Nessas pesquisas os traficantes apareciam em terceiro lugar, como promotores desse maléfico uso.
Com efeito, passar do juízo de fato ao juízo de valor é responsabilidade demasiada para quem ainda não viveu o fato ou ainda não adquiriu experiência suficiente para bem calcular as conseqüências de seus atos: “Como se pode observar, senso moral e consciência moral são inseparáveis da vida cultural; uma vez que esta define para seus membros os valores positivos e negativos que devem respeitar ou detestar”. (Opus cit., p. 336)
A solidariedade nos leva a participar dos problemas alheios, mas quando o meio social é formado por indivíduos que ainda não aprenderam a trabalhar bem com os critérios, dele não se pode esperar uma boa escolha dos valores.
Nos dias atuais nós temos ouvido falar muito sobre prevenção contra o uso de drogas. O meio mais eficaz continua sendo o da manutenção de uma boa convivência familiar onde, começando pela iniciativa de pais ou tutores, seja possível estabelecer diálogos permanentes, francos e abertos sobre todos os problemas da vida. Essa fórmula exige dedicação e humildade e se quisermos nos dedicar ao bem estar da família teremos, muitas vezes, que renunciar nossas prioridades pessoais. Já o comportamento humilde é bem mais difícil de trabalhar em nós mesmos. Em contra partida, ele é denunciador da verdadeira nobreza dos caracteres. É a feição fundamental que constrange os pais a admitirem, perante seus próprios filhos, que precisarão de algum tempo para responder com certeza a respeito das questões sobre as quais admitem não estarem bem preparados no momento.
O diálogo em família não tem o poder de evitar o assédio dos conselheiros imaturos. Mas se o praticarmos com perseverança, haveremos de conhecer que dele será, aos poucos, a última palavra sobre todos os problemas da vida. Tanto para os filhos quanto para os pais.

Publicado em 07.01.97, jornal Correio do  ABC

(*) Ainda jovem, foi organizador e presidente do “CAV - Centro de Auxílio à Vida”. O Sr. Odair era um ex-dependente de drogar que, recuperado, consagrou-se à nobre causa de auxiliar muitos dependentes químicos. Em 1997 eu servi o CAV em tempo integral e durante 10 meses consecutivos, sob a competente direção do Sr. Odair, tanto como palestrante, quanto como consultor administrativo e conselheiro junto aos recuperandos, isto com ênfase focada na sua reintegração profissional útil na sociedade depois de à ela devolvidos já recuperados.

Com a reedição deste atual artigo, presto minha sincera homenagem ao senhor Odair. Por informação recebida na semana passada, fiquei sabendo que este grande homem, cuja obra realizada no CAV, que ajudou a tantos outros a se recuperarem das dependências químicas, fora assassinado depois de sucumbir novamente à dependência delas.

“A quem honra, honra” (Romanos 13:7). 

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