O Alecrim e o Girassol
“Cultivado assim para não ser como o primo”, repetiam os pais àqueles que
apresentavam o filho, novo membro de um ramo da família dos Alecrim. Mas também
faziam questão de esclarecer que nada tinham a ver com a família do mesmo nome,
gente selvagem, brava e grosseira que vivia no mato.
Preparado desde criança para esse
expletivo, o Alecrim Júnior crescera obrigado a cultivar maneirismos elegantes,
arbítrios esnobes que compartilhavam a camaradagem dos insinceros.
Como estava na moda ter a pele lisa e
alva como o marfim, desde menino os pais também o acostumaram a evitar exposições
aos raios solares.
Na vizinhança, crescera com ele um
rebento da família dos Girassóis e a este os pais ensinaram o antigo pendor
familiar que lhes rendera o epíteto de “filhos da luz”. E dados a esse costume tornaram-se altos em relação aos membros de outras famílias que proliferavam no
mesmo sítio.
Logo uma vizinhança neutra entre os
costumes dos Alecrins e dos Girassóis entendeu que estes assim cresciam para
que a mania dos “filhos das trevas” não projetasse sobre eles a sombra dos seus
costumes. E houve os que passaram a imitá-los, mas também os que preferiram
costumes opostos, tradicionais entre os alecrins.
Mas não era somente no corpo dos membros
da família Girassol que se manifestava o bom aspecto produzido pelo sol, ao
qual buscavam incessantemente voltando suas faces para receberem nelas os raios
benditos de luz, calor e vida. O viço do corpo era mostra do que se passava nas
suas almas, pois também as mantinham voltadas para outro sol bem mais
esplendoroso que iluminava, aquecia e lhes transmitia vida para sempre no
equinócio permanente do dia eterno.
Na noite prolongada do solstício de
sombra eterna o Alecrim estiolou-se, feneceu, e o seu corpo ao virar pó que
volta ao pó, misturou-se ao muco da noite eterna. Dessa união nasceu um novo e
minúsculo pântano de areia movediça que acabou tragado pelo abismo em que
repousar não pudera o par que lhe dera a morte.
Feneceu também o Girassol, que jamais
abandonara a luz dos sóis que saúde lhe rendera ao corpo e à alma, e como
aconteceu com o corpo do Alecrim, também o seu virou pó que volta ao pó. Mas no
dia eterno, veio sobre ele um bom tornado que o tragou, elevando-o aos céus dos
céus.
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