Carlos Mendes
"Quando o eu não é negado, ele é necessariamente adorado"[ii],
escreveu um anônimo. E a graça não visita a casa que permanece trancada pela
usurpação do "eu".
Os familiares deste senhor, que agora elejo personagem
desta parênese, tem filiações com outros que
encontramos na família da divertida crônica: "Passeio na Ilha do Seu
Usucapião", do poeta Drummond. E o nosso filólogo Pedro Luft gostou da
brincadeira e nela entrou, animando-me ao contributo.
De nosso "eu" - o usucapião desta parênese -, descendem: usucapiente, usucapir e usucapto. Pela sua demência, este último lembra O Mentecapto, de Fernando Sabino, e anda usucapindo favores ilícitos.
Conforme os
personagens descritos pelo poeta e o filólogo, Usucapião, o patriarca da famigerada família, é prático na
usucapionagem. É um usucaptor! Ele espia, espiona oportunidades de "levar
vantagem em tudo", de ter direito ao uso e gozo de todas as coisas, ou seja,
aproveitar-se de um cupão permanente
que lhe dê direitos e usos pessoais irrestritos.
Esse
"eu", que assume aqui o personagem usucapíão, não pode mesmo ter o governo de nós mesmos, pois o
"eu" exerce um governo maligno cujas ações finalizam as dores
contraditórias a que Agostinho aludiu em "O Sofrimento Universal". O
bem que queremos fora do "eu" se desvanece e estiola nas ações do
"eu".
O que digo,
então, nesta parênese? Que não sabemos amar e ser felizes, pois, como nos
ensina Leibniz numa abordagem filosófica ao Texto Sagrado no Evangelho de João
3:16: "Amare est gaudere felicitat
alterius"[iii]
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