Aquela
gente antiga
Os viventes no auriverde torrão
alienaram o que não podiam deixar escapar.
Ao falar assim eu penso em um bem
significante, e com tanta clareza esquadrinho o seu alto valor que “se não o
vejo e o espírito o afigura”(1) me conformar eu não posso com os
olhares postos nas dedicações estranhas ao meu preferido interesse.
Aurifulgente pepita de quilate
inexcedível é a honra. E que outra virtude a excederá?
Mais pareço um desvairado ao ver,
inconformado, o que acontece com as preferências do meu povo brasileiro. Ele
ama-se acima da estima de um patriota pela sua nação. Faz de ventos sua azenha;
está sempre “no mundo da lua”, enlouquecido pela inútil fama pessoal. É a
alienação e a angústia girando como calidoscópio num visor de fama pessoal, que
tirado do olho atento aos movimentos dos desprezíveis vidrinhos produzindo
brilhos coloridos como se safira fossem e nada mais deixando à vista senão a
realidade de um tubo enganador.
O que redimiria a minha alma,
devolvendo-lhe as antigas querências, pois qual gado domesticado eu permaneci
prazerosamente sob boas tutelas paternais? A vida boa familiar se apegando ao
sentimento anunciado nas capas dos cadernos escolares onde pela primeira vez eu
li: “a pátria é a família amplificada” (2), frase que testemunhava
das amizades com os vizinhos sentados em bancos postos juntos às cercas fronteiriças
das propriedades e para onde todos, às vezes da quadra inteira, se achegavam.
Naqueles bancos comunais arranjados com alegria por quem à rua aparecia
primeiro, sentavam-se doutos visinhos de mistura com pedreiros, motorneiros,
funcionários públicos!...
Aquela gente antiga devia agora
ressurgir para levar-nos em passeata até aos palácios dos poderosos, que poder
receberam pelos nossos votos. Certamente Dona Prazeres, levaria sua vassoura de
palha e a meteria nos fundilhos dos dilapidadores do erário, que envilecem a
nossa estremecida pátria, expediente que ela usava contra os filhos malandros,
para ensinar-lhes a honrarem os seus compromissos com a escola e, mais tarde,
com o trabalho de onde tiraram o sustento digno para eles e para os seus
dependentes. E que os patifes nem ousassem assentar-se naquele sagrado banco
comunal de gente de bem que ali se reunia, para que o instrumento corretivo de
dona Prazeres não vibrasse nos seus fundilhos!
Devemos caminhar sobranceiramente,
pois a gloria pessoal redunda no fastio de nós mesmos. E perto estamos de
sentir esse alto-enojamento, pois há muitos que usam o poder que lhes demos
pelo voto, instrumento para nos humilharem até a infamante condição de escravos
seus.
Antes preferisse à fama passageira
do assinar reportagens ocas o caminhar nobremente, ombro unido a outros meus
iguais, como eu tangidos pelo ideal da entrega cega do melhor que temos.
Caminhar com o olhar tapado para o promíscuo luxo, que só a fama de
reconhecimento a valores individuais deseja.
Carlos
Mendes
Escritor.
Autor dos romances: O Milênio e o Tempo.
Sem comentários:
Enviar um comentário