Santelo
Conto de: Carlos Mendes
Personagens:
•
Arbítrio, narrador
e personagem da história.
•
Castão,
Moralista que vive fazendo sermões.
•
Infausto, É
o protagonista que vê desgraça em tudo.
•
Pôla, personagem
que interage como opositora ao Arbítrio, que a quer convencer sobre os bons
arbítrios.
•
Pureza e Trindade, personagens figurantes. Tímidos, eles interagem mais como
ouvintes e espectadores; são agentes passivos que deixam conhecer os seus
sentimentos íntimos pelo que pensam e pelas reações emotivas que transparecem
nos seus gestos e expressões fisionômicas.
•
Santelo é
o personagem central da história. Pertence a memorialista de
Arbítrio, seu discípulo, que tem do mestre ensinamentos para sustentar suas
exortações. Os fatos ligados a este personagem Santelo[1]
são reais, e o autor transformou-os em tecido literário romanesco escrito em
linguagem poética constituída de frases e períodos escritos com palavras do
mesmo grupo fonético, o que emprestou sonoridade à audição da obra, se
declamada. O leitor também encontrará alguns ornamentos de linguagem que
atenderam o propósito de contribuír com o quê poético da obra.
•
Os
feitos da história são de cunho realista por basearem-se na obra de um
evangelista, donde o título Santelo, que ganhou. Esses feitos foram conhecidos
pelo autor, que os viu realizados, ou ouviu-os por relatos extáticos, que soem
acontecer quando um “pescador de homens” recebe o prêmio de levar um pecador ao
arrependimento diante de Deus.
Em memória
de:
Manuel e
Hilda Mendes
“Meus
pais, que me ensinaram a caminhar pelo “caminho estreito” que leva à Salvação
Eterna”
Santelo
Quando Santelo se fixou por ali, logo todos o consideraram cheio de
paixão pelas almas. Pôla, como era conhecida Paula pelo feito lingüístico do
irmão caçula ao balbuciar-lhe o nome
pela primeira vez, chamou para si a atenção com o costumeiro e ruidoso muxoxo
que fazia quando ouvia o que não a agradava.
—
Paixão é coisa que se tem pelo concreto – disse sacudindo as pernas curtas
abaixo das saliências laterais das fartas nádegas, esparramadas pelo assento da
cadeira embora premidas pela calça de fustão turquesa que trajava.
Sentado
na poltrona em frente à de Arbítrio, que sempre lhe fornecia a base dos
pensamentos, e prior natural das questões colocadas para o grupo, Castão tinha
a carranca fechada e olhos postos em Pôla, tola perante o seu parecer. Não
ficou só na carranca. Foi prontamente falando:
—
Sem fé não se tem chance de conhecer os postulados da Palavra...
Da
discrição passou para o conselho:
—
Ó Pola, deixe a boa visão de Deus governar os teus zelos.
—
Gosto do vocativo dessa zanga do Castão – disse Infausto juntando-se à valorosa
demanda. – Duro juízo vem!..., bradou valorizando o “vem” do vaticínio.
—
Os sermões do Santelo destinavam-se a pequenos peixes – balbuciou Pôla amuada.
— Porque preferia trabalhar com os
desvalidos?... És capaz de compreender o quanto procurava preparar-se para
chegar a eles? – defendeu Arbítrio.
—
Qual a cultura desses pobres párias para que precisasse de preparo? – Póla
continuava sarcástica.
—
Significação cheia de parcialidade. Pecado que pode conduzir-te ao subterrâneo
dos falecidos! – proclamou Infausto.
A
volúvel zombaria de Pôla não justificava a fala fatídica de Infausto, julgou
Arbítrio. Enquanto vivesse seria viável a sua salvação.
—
Santelo zelava pela liberdade real
—
Real ou sonho sem sentido? – zunil a sibilante reação de Póla.
Calando-se
quanto ao rumo da conversa, Arbítrio governou o conselho com a razão do seu
Rei.
—
Falsidades são todas as coisas que conhecemos; não são feitas do que parecem
ser. Se te puseres a calcular a tua felicidade por elas, falharás! – pregou
Castão.
—
E amor ardente não olha o aparente. O mundão é lindo, mas só tem presente. Ele não terá mais amanhã quando findar –
suave e lento Arbítrio ia falando.
Pôla ficou calada e ele continuou
tentando convencê-la da etérea existência da alma, objeto da paixão de Santelo.
—
Jovem baderneiro ganhava duvidosamente a vida. Santelo, vizinho dele,
garantiu-lhe a vulgaridade do seu viver desbaratado. Vejam o jeito do
jambeiro... – disse Arbítrio com voz de zéfiro. – ...Sua pequena tela se
fechando para pegar esse peixe tão chué, pequeno, todo tisnado de tantos
pecados.
Fez
pausa para pensar.
Pôla
botou as mãos nos bolsos da jaqueta vendo Castão boquiaberto e Infausto
vangloriando-se da desdita do jovem vilão bem descrito por Arbítrio.
—
Transformou-se o mal menino?
Castão
perguntava e Pôla se chateava pelo feito. Ficavam calados os bons de ouvido. Um
era o Trindade, chamado assim pela fé dos pais nas três pessoas do Todo
Poderoso, ao se converterem. Do sexo feminino era quem se sentava próximo de
Castão; se chamava Pureza e tinha procedimento condizente com o nome.
— A bondade de
Deus deu-lhe a vida e Santelo dedicou-se a guiá-lo na busca do galardão zenital
– disse Arbítrio jubiloso.
Infausto falou
do trágico fim de Pôla, chamando-a de perdida contumaz caso ficasse titubeante
perante o sacrifício de Cristo.
— Vê bem,
Pôla: justiça deve governar a vida e Deus gosta da bondade – garantiu Castão.
— Conta-se que
Santelo, dia ainda cedo, com unção de talento procurava sem pejo jagunço
violento. Achou-o desbotado, sem cor e sem fama debruçado num balcão tomando
uma Brama. Justo em bar de ladrão entregando volantes, estendeu a sua mão ao
violento vilão. Palavras vibrantes de misericórdia provocaram discórdia entre
os meliantes. Ameaçou Santelo o vilão mais franzino vibrando um martelo. Outro,
o Tomazino, punhos qual cutelo, defendeu o Santelo.
Com zombaria
no olhar relutante e laborando solapar o raciocínio, Pôla ruminou:
— Pões contos
da carochinha no argumento. No fundo tal situação não se sustenta.
—
Sem falsidade te falo. E conto fatos consumados pela pregação da fé em
Cristo perante tantos quantos creram.
—
Tens de outro um testemunho não duvidoso?
Arbítrio
girou o olhar e falou:
—
Lembro de um bom para contar.
Pôla,
mãos guardadas nos bolsos, verga-se devagar e engole a baba para não vazar da
boca já disposta a balbuciar suas dúvidas.
—
Teu ceticismo transparece sem pronunciares palavra – falou Castão com semblante
tristonho.
—
Ainda que talentoso o argumento, bem a voz calando, Pôla nem no amanhã se
encontrará diante da senda da esperança – sentenciou Infausto.
O
taciturno Trindade e a sincera Pureza pareciam querer chorar. Suspiraram
calando o pranto pronto para corromper sentimentos chocantes.
Almas
bondosas e desgostadas com a vetusta injustiça da vida debalde vivida.
Parece
que os feridos cuidados da paixão pelas almas sacudiram os sentimentos de Pôla,
pensou Arbítrio se animando a contar-lhe a história.
—
Certa vez Santelo conheceu um comerciante que se proclamava ateu. Materialista
e bem de posses ele tinha certezas confusas, pois freqüentava sessões
espíritas...
—
Materialista, mas não muito!
Pôla
manifestava anuência. Muitas noites e até em madrugadas manipulou seu gnomo.
—
O que o comerciante fazia? – perguntou Castão.
—
Tinha empresa de construção civil e sócio pouco fiel. Quando construía
outro salão de
cultos para uma igreja conheceu o congregado Santelo e contou-lhe que o
sócio o estava fraudando tanto que, fatalmente, perderia a sua parte na sociedade. Se tal acontecesse,
o mataria; nem mais nem menos, pois a sobrevivência da família dependia da
firma.
Pureza
desgostou-se diante da ostentosa violência.
Arbítrio
demorou para continuar. Parou, tossiu, percebeu a comoção e prosseguiu:
—
O homem tinha necessidade de dizer-lhe tudo e esperava conhecer melhor conselho
para se livrar do medo de “pirar”. Contou todos os seus cuidados a Santelo e
perguntou-lhe:
—
“O quê eu posso fazer?”
—
“Confiar” – foi a resposta.
—
“No quê?”
—
“No quê não.”
—
“Em quem?!...”
—
“Sim, em Cristo!” foi a palavra de poder
de Santelo. O comerciante queria
confiar, tão precisado estava de solução para o seu caso. Depois de dias e já
gozando boa disposição voltou a avistar-se com Santelo e lhe disse:
—
“Desafiei Jesus!”
—
“Qual o repto?”
—
“Falei-lhe: Te chamam Filho de Deus; se podes compadecer-te, prova-me
solucionando o problema que tenho.”
—
“Qual a resposta?”
—
“Silenciosa e real!”
—
“Ganhaste um Rei?”
—
“Sim, um Monarca bom e majestoso!”
Pôla
tinha colocado um chiclete na boca e Castão falou que o seu consumo não tinha
proveito. Só provocava ferida no estômago!
—
Quem gosta de bobagens verá jorrar os danos das gulodices descontroladas –
vaticinou Infausto.
Tirando
os pés do travessão de apoio da cadeira, mãos postas no assento e abaixo das
cochas, Pôla começou a sacudir as pernas curtas. Indiferente, punha os seus
olhos ora no pregador ora no profeta de tragédias. Ia preparando com a língua a
pasta do chiclete até se fazer uma película fina que prendeu aos lábios. Soprou
uma bola que foi aumentando até estourar. O chiclete se lhe pegou aos lábios e
nariz. Ela o lambeu e começou uma Mastigação barulhenta simbolizando o seu
desprezo total pela pregação e advertência dos dois. A seguir falou enfrentando
a feição pacífica de Arbítrio:
—
Desejas tornar-nos nativistas das tradições fenomenais; não duvido da tua
narrativa. Todavia tal notícia não faz parte do dia a dia dos denominados
discípulos de Jesus.
—
Argumentas com a realidade, mas não granjeias razão; quanto relatei, garanto. A
Graça não é remédio contumaz, ainda que se compraza no governo dos remidos por
Cristo.
Arbítrio
conservava o olhar sereno fixado na face de Póla, que se quedava calada.
—
Sob o sol se acham pântanos infestados por sucuris e prados cheios de flores;
tem também a fé dos fiéis que consterna o coração do Santo Pai a conservá-los
em portos seguros. Mas é na bondade de Deus que o justo alcança galardão,
bastando vigiar boa jornada que agrade o seu juízo, onde desponta o desejo de
ganhar viajores vindos da desventura, jornada de volta dos justificados por
Jesus.
—
Sem essa lealdade sujeitam-se à ruína? – zomba a relutante Pôla.
—
Não há diferença. Justos e injustos estão debaixo do juízo de Deus.
—
A desgraça vem de Deus? – pergunta Pureza, bisonha.
—
A verdade vem de Deus. A desgraça vem do homem, por deter a verdade em
injustiça, julgou um dia Santelo com base na Bíblia e diante de alguém que
jogou esse argumento.
—
Que confusão!
—
Compreende, Pôla – falou Arbítrio em seu socorro –, o conhecimento sem a fé
sustenta a falsidade.
—
Considero fanatismo pensar que o sujeito do conhecimento só será capaz de
proposições verdadeiras se tiver a tua fé – argumentou Pôla em testemunho da
sua capacidade filosófica.
—
Ponderando sobre a falsidade – falou Arbítrio sem se perturbar – a sua
preocupação é com o conseqüente sem considerar o antecedente. Se chamamos
verdadeira a coisa criada, fica sem sustento a ponderação da criação por um
poder passivo. Falsidade filosófica, portanto.
—
Podemos falsificar o processo criativo, Pôla? – perguntou Pureza
—
A falsidade troca confidências com a perdição quando pondera sobre o fato e
conclui que ele é cousa surgida sem causa produtora – acrescentou Infausto.
—
Deus não se agrada da dúvida do viandante...
—
Com farnel de boas obras, o breu da noite nos devolve à vida – interrompeu Pôla
a fala de Castão, cuspindo o chiclete na cesta de papel atrás de sua cadeira.
—
Lembro de um caso contado por Santelo...
Arbítrio
tinha os dedos trançados e anúncio no olhar ditoso.
—
Galdino, que trabalhava de engenheiro e tinha casa perto de uma paróquia, foi
visitado por Santelo já na virada da sua vida. Lia suas literaturas religiosas
na sala onde estavam misturadas publicações espíritas, mapas zodiacais, Bíblias
azuis, amarelas e pretas; pequenos boletins da paróquia, bandeiras místicas,
pés de coelhos, mantas de presbíteros. Santelo fez-se anunciar falando que
trazia convite para a família participar de uma importante cerimônia. Diante
daquela galeria de objetos no interior da casa – coisas como a garantir a bem-aventurança de
Deus – deparando-se com as Bíblias pergunta:
—
“Crês na Bíblia?”
—
“Creio – garante Galdino e continua: —
“És religioso?”
—
“Sou pescador de homens, conheces a frase?’
Galdino
afunda na cadeira, receando o rumo da conversa.
—
“Crês que a Bíblia é a Palavra de Deus?”
—
“Não tenho nenhuma dúvida disso”.
—
“Crês em Jesus?” – seguiu perguntando o Santelo.
O
“creio” era pouco convincente.
—
“Quem é Jesus?” – Santelo queria saber qual o tipo de fé de Galdino em Cristo.
—
“Entre os espíritos luminares ele seria o sol.”
—
“Crês que Ele é o filho do Todo Poderoso?”
—
“Não.”
—
“A Palavra pode confirmar que sim.”
—
“Mostra-me, então” – desafia Galdino.
—
“Qual a Bíblia que eu posso usar?” – pergunta Santelo apontando para as que
estavam na prateleira próxima.
—
“Aquela ali” – aponta Galdino para uma delas.
—
“Essa é a única que não serve, e creio que
sabes disso.”
—
“Então escolhe a que quiseres.”
Santelo
estende a mão e pega a Bíblia editada pelos espíritas. Galdino sorri
sapientíssimo e acompanha a busca de Santelo na Bíblia até começar a ditar-lhe
a passagem:
—
“Tomé respondeu e disse-lhe: Senhor meu e Deus meu! Disse-lhe Jesus: Porque me
viste, Tomé, creste?;...”
—
“Não terá Tomé exclamado para Deus numa tontura extática?”
Santelo
esperava por essa proclamação faltosa de fé. Procura outro texto, procura mais
outro...
Ao
fim de dez passagens despedem-se. A porta de saída do quintal Galdino diz:
—
“Agora só falta ouvir o que o pároco tem a falar.”
Lá
no final da rua Santelo olha à ré. Galdino faz-lhe um sinal. A mão parece
pequena no aceno indecifrável.
No grupo, alguns aguardavam um bom júbilo; desgosto
visível em Pureza e zanga jucunda em Pola.
—
Faz-me o favor de falar: qual das tuas falácias se pode considerar?
—
Olha aqui, ó Castão, caça na massa cefálica mórbida centelha de fé, pois quem
não tem querer, precisa crer.
—
Não duvidas do teu dito? – diz Arbítrio tristonho. – Tanto Deus nos deu; tudo
nos deixou! Dentro de nós ou não, de nosso nada temos. É tudo dele!
—
Jazer na grandeza duvidosa é considerar a basbaque direção visionária.
—
Pensas como tola; te cansas com a dança terreal. Com fé podias trocar o passo
dessa polca e dançar o balé do Criador.
—
Proponho o tema fraternidade! “Pondera, ó chato Castão, se tens projeto
superior para considerarmos”, pensou Pôla após a fala, querendo fazer conhecida
sua superioridade filosófica.
—
Qual a gnose?
Pôla
calou, gaguejou com a questão, gargarejou ruídos querendo contestar o
gongorismo.(*)
—
É o ganho religioso que te contenta! - completou Castão rumorejante.
—
Vamos debater governados do bom juízo? disse Arbítrio aos dois zangados.
—
Como ponderar sobre a fraternidade? Se a chamamos de sentimento fiel temos de
conceituar a fidelidade.
—
O que é ser fiel, Castão? – pergunta Pôla.
—
Diria isso de um dom governo verdadeiro.
—
Mente: é boa probabilidade?
—
Materialmente pode mostrar-se boa. Mas precisa de bondade para o bem produzir.
—
E Bondade é virtude divina – garante Arbítrio –. Em gente vil bondade vem e
vai. Virtude é gestão vencedora de Deus.
—
Subjugastes fraternidade aos predicados supremos e fostes perspicaz – pondera
Póla –. E igualdade, podemos tê-la com o Supremo?
—
Esse tema seduz, sibila Pureza.
—
O Todo-Poderoso nos fez do pó. Contudo, pode tudo o Senhor e chamou-nos para Si
pelo Filho querido, que é tal qual somos.
—
Falas sobre o Cristo?
—
Sim, Jesus fez-se homem e salvou-nos da vil separação.
“A
Pôla muda para a banda bendita?”, pondera Pureza.
“Deixa-se
nascer de novo!”, não titubeia o Trindade.
“Vê,
afinal, a justiça !”, julga Infausto, visivelmente feliz.
—
Cristo te salva e te faz filha do Pai! – exclama Castão querendo persuadir a
titubeante Pôla.
Tudo
isso pensam e falam num dia que se chama: hoje! Passado histórico imperando sem
se tornar impositivo.
“Querem
retê-la no redil.”
“Rogam
ganhá-la para Cristo.”
Pôla
rola os olhos. Pondera a fé em
todos. Sente claudicar o pulsar do compromisso e fecha-se na
ponderação das possibilidades tantas que chamam de fé.
—
Se restringe a liberdade? Sob a realeza zenital estarei subjugada?
—
Liberdade zanga com a realidade se levares a sério o zanzar desta lida.
—
Jorra do jacá de Deus?
—
O Senhor a tem em si, pois é o Todo-Poderoso. Tú podes tudo ó Pôla?
—
A Bíblia diz: “Deus é espírito”. Na jeira* de Deus o governo é dos espíritos.
—
Voltas ao gnosticismo espiritualista.
—
É gnose comprovada – garante Pôla.
—
Te sustentaste na Palavra e agora foges tentando as fracas possibilidades
kardecistas. Se crês em tudo, te faltarão convicções. Falar pela Palavra é
suficiente.
Arbítrio levava a rixa pelas rédeas da lealdade. Sozinho,
o zelo do seu Rei se impunha. Calavam-se os demais percebendo a tutelar
garantia da Palavra de Deus, pois ele botava boca afora os conselhos da Bíblia.
—
Por que temeria eu se falhassem as promessas do Todo-Poderoso conforme as tenho
na Sua Palavra e estivesses tú certa? — Conforme os kardecistas eu tornaria a ser.
—
Contudo, se falharem os kardecistas e forem certas as palavras do testemunho
dos profetas, que possibilidade terás de ser chamada ao céu, se para o além
partires sem Cristo?
Pôla
parecia gelada, pois tinha as bochechas desbotadas. Arbítrio dirigiu-lhe um
gesto bondoso, como a dizer-lhe: queda-te confiante. Depois continuou:
—
Falaste: “Com farnel de boas obras, o breu da noite nos devolve à vida”. Julga
bem: Deixará Deus dois espíritos vivendo na vileza* e vasculhando a jeira Dele?
“Mostra-se
minguado o bom senso de Pôla” ? pondera a bondosa Pureza.
“Debate-se
na dúvida”? – deduz Trindade.
“Sente-se reprovada diante das
zelosas sutilezas daquele seguidor do Senhor? –
reflete Infausto.
Cabisbaixa,
Pôla sacode as pernas.
— Quantas
tolices tenho pensado sobre tudo quanto pedes para pronunciar-me. Presentemente
posso calcular que tudo quanto eu cria era falso. Quero a Cristo tanto quanto
tenho percebido ser o querer de todos os chamados seus.
Assim, lindo
mundo mostrou um novo amanhã conquistado por Pôla.
*gongorismo
- excesso de metáforas, antíteses e anástrofes
*jeira -
A extensão de terreno que uma junta de bois pode arar num dia
*vileza -
que vive numa vida
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